A coragem perfeita e a completa covardia são dois extremos a que raramente se chega. A distância que existe entre ambas é vasta, compreendendo todas as outras espécies de co ragem: não há menos diferença entre elas que entre as fisionomias e os temperamentos. Há homens que se expõem voluntariamente no começo de uma refrega, mas que se relaxam e recuam facilmente ante sua duração; outros se contentam com satisfazer as honrarias do mundo e fazem pouco além disso. Vêem-se os que nem sempre dominam o seu medo; outros que se deixam, às vezes, arrastar por temores generalizados; outros que vão à luta porque não ousam permanecer em seus postos. Certos há em que o hábito dos pequenos perigos fortalece a coragem, preparando-os para se expor aos maiores. Existem os que são corajosos a poder da espada e que temem tiros de mosquete; outros que se sentem seguros com tiros do mosquete e temem bater-se à espada. Todas essas coragens, de diferentes espécies, concordam em que a noite, aumentando o medo e ocultando tanto as boas como as más açoes, dá a todos liberdade de se pouparem. Ainda há uma outra esquivança mais geral; porque não se conhece, absolutamente, um homem que fizesse tudo quanto seria capaz de fazer em determinada ocasião, se estivesse seguro de voltar: de maneira que é evidente que o temor da morte subtrai algo da coragem.
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